No próximo dia 6 de novembro de 2025, Angola prestará homenagem aos três signatários do Acordo de Alvor — António Agostinho Neto, Holden Roberto e Jonas Savimbi — com a Ordem da Independência de 1.ª Classe.
O gesto, apresentado como uma reafirmação da reconciliação nacional, encerra simbolicamente meio século de história política e militar.
Mas, como toda narrativa oficial, também esta carrega os seus silêncios.
AUSÊNCIAS QUE FALAM ALTO
A cerimónia foi ampla, mas não total.
Muitos aceitaram o convite. Alguns recusaram. E outros, por razões que vão do esquecimento à opção política, ficaram de fora.
Entre os ausentes, há nomes que marcaram profundamente o percurso institucional, económico e cultural do país.
MANUEL DOMINGOS VICENTE
Vice-presidente da República entre 2012 e 2017 e presidente da Sonangol de 1999 a 2012, Manuel Vicente foi o principal arquiteto do ciclo de crescimento económico impulsionado pelo petróleo.
Ignorar o seu papel é ignorar uma fase estratégica da economia nacional e da própria consolidação do Estado pós-guerra.
A sua ausência é mais do que uma omissão: é um sintoma da forma como Angola lida com o seu passado recente.
Fontes:
Jornal de Angola (2017);
Marques de Morais, R. (2011). O Grande Espetáculo do Petróleo. Lisboa: Tinta-da-China;
Economist Intelligence Unit, Angola Country Report (2013–2016).
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LUVUALO DE CARVALHO
Diplomata e embaixador itinerante, Luvualo de Carvalho representou Angola em diversos fóruns internacionais e trabalhou pela reabilitação da imagem externa do país no pós-guerra.
A sua ausência nesta homenagem é um silêncio diplomático difícil de justificar, sobretudo tratando-se de quem personificou o esforço de credibilização externa de Angola entre 2014 e 2019.
Fontes:
Angop (2014);
Ministério das Relações Exteriores de Angola, Relatórios Anuais de Política Externa (2015–2019).
TITO CAMBANJE
Jurista e académico da nova geração, Tito Cambaje destacou-se como comentador político e defensor da estabilidade institucional.
É uma voz jovem da intelectualidade governista cuja exclusão revela a dificuldade do sistema em reconhecer mérito emergente e renovar os seus símbolos de legitimidade.
Fontes:
TV Zimbo, programa Angola Fala Só (2023);
Jornal de Angola (2022).
ISABEL DOS SANTOS E COREON DÚ
Representam duas dimensões incontornáveis da Angola contemporânea: a empresarial e a cultural.
Isabel dos Santos projetou-se como a empresária mais conhecida do país, criando emprego, internacionalizando marcas e simbolizando a ambição de modernização.
Coreon Dú, por sua vez, destacou-se como promotor da música urbana e do kuduro, levando a estética angolana a palcos internacionais.
O empenho de ambos é amplamente reconhecido e simboliza uma geração que, independentemente de controvérsias, investiu na imagem e na identidade nacional.
Fontes:
Forbes Africa (2013);
BBC Africa (2020);
New African Magazine (2014);
Billboard Africa (2018).
RECONHECER É RECONCILIAR
A condecoração de 6 de novembro é mais do que um gesto cerimonial.
É uma forma de afirmar quem somos, quem valorizamos e que memória queremos preservar.
Quando figuras centrais ficam de fora, a narrativa oficial perde densidade e corre o risco de se tornar seletiva.
Reconhecer não é endossar: é compreender a totalidade da história, com as suas luzes e sombras.
Pelo sim e pelo não, fica o registo de uma longa jornada feita de presenças, ausências e memórias que ainda pedem reconciliação plena.
A MEMÓRIA COMO POLÍTICA DE ESTADO
O gesto de 2025 não surge isolado.
Ele insere-se na lógica do Processo de Reconciliação Nacional e Memória Histórica (PRNM), lançado oficialmente pelo Executivo em 2021, com o propósito de honrar as vítimas do conflito armado e restaurar a coesão moral da nação.
Contudo, a eficácia desse processo depende de uma prática de memória que não selecione conveniências nem apague contradições.
Como lembra o filósofo Paul Ricoeur (2004),
“A memória justa é aquela que não absolve nem condena em bloco, mas compreende o percurso humano na sua inteireza.”
Angola precisa dessa memória — não apenas como gesto de reparação, mas como fundamento ético da reconciliação nacional.
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