José Eduardo dos Santos é
destes amigos improváveis arranjados pela diplomacia brasileira nos
últimos anos. No comando de Angola há mais de 37 anos, dos Santos
estreitou laços com o Brasil e trabalhou para fazer com que as relações
entre os dois países crescessem vertiginosamente. Hoje, o país é o
principal destino das exportações brasileiras para o continente
africano.
Por Filipe Hermes | Folha Política
Muito mais do que apenas importar
produtos brasileiros, no entanto, Angola se especializou em dar boas
vindas às nossas empreiteiras. O resultado é que nenhum outro lugar do
mundo, nem mesmo Cuba ou Venezuela, recebeu tantos recursos por parte do
Brasil quanto o país da costa oeste africana. Foram R$ 14 bilhões em 8
anos.
Nação de língua portuguesa, Angola
aprendeu bastante rápido a pronunciar um sobrenome em partiular, quase
tão influente no país quanto o próprio Santos: “Odebrecht”. Por lá, a
empreiteira brasileira, cujo presidente encontra-se atualmente preso em
Curitiba, possui um shopping center, uma rede de supermercados, constrói
hidrelétricas, rodovias e saneamento. É da Odebrecht também a honra de
patrocinar o “Santos Futebol Clube”, o time do presidente, além da sua
campanha presidencial (sim, em tese, dos Santos se reelege desde 1979).
Segundo o marqueteiro João Santana, a empresa teria contribuído com US$
50 milhões para a campanha.
Por lá, a empreiteira é considerada a
maior empregadora privada do país, com quase 20 mil funcionários. Exceto
algumas condenações por uso de trabalho escravo, as relações com o
governo não poderiam ser melhores. Entre os 70 projetos financiados pelo
BNDES no país, nada menos do que 60% deles haviam sido executados pela
empreiteira, mais do que o triplo da segunda colocada, a Andrade
Gutierrez. Em 10 anos, a Odebrecht concentrou 82% dos repasses do BNDES
no exterior: uma cifra assustadora de R$ 41,3 bilhões.
Não apenas de financiamento brasileiro,
porém, vive a Odebrecht em Angola. Boa parte do Biocom, um projeto que
une a produção de etanol, açúcar e eletricidade, é financiado pelo
próprio governo angolano, sócio na empreitada de US$ 400 milhões. Além
da estatal Sonangol, do setor petrolífero, a Odebrecht tem como sócia
uma empresa denominada Damer, fundada em 2007 pelo então vice-presidente
eleito, e 3 generais.
Comandando um dos países que mais
crescem no planeta, dos Santos acumulou uma fortuna considerável – assim
como sua filha Isabel, tida como a mulher mais rica do continente
africano. Isabel é sócia em empresas de telecomunicações, além de
cimenteiras, o que lhe rende um patrimônio de US$ 3 bilhões. Tal
fortuna, no entanto, não causa inveja ao pai, cujas estimativas apontam
para um patrimônio de US$ 20 bilhões. Juntos, pai e filha são o primeiro
e o segundo colocados no ranking dos mais ricos do continente.
Membros menos abastados da família,
Welwitschea José dos Santos e José Eduardo Paulino dos Santos, filhos do
presidente, também possuem sua cota de relação com a empreiteira
brasileira. Ambos são sócios da companhia “Di Oro”, junto de Hugo André
Nobre, genro do presidente e marido de Isabel. Di Oro e Odebrecht se
associaram no projeto “Muanga”, responsável por prospectar e explorar
diamantes em uma das províncias do país. Até a obtenção do contrato, a
companhia Di Oro possuía, segundo membros de movimentos anti-corrupção
angolanos, um objeto social que lhe descrevia como uma empresa do setor
de moda e alta costura.
Enquanto não está construindo uma rede
de supermercados estatais (posteriormente privatizada em uma licitação
vencida pela própria empreiteira), ou o centro de treinamento do time do
presidente, a Odebrecht especializou-se em vencer licitações para o
setor rodoviário em Angola. Em um dos projetos, “Vias Luandas”, a
companhia ficou responsável por construir mais de 32 mil quilômetros de
saneamento e urbanização nas principais rodovias da capital angolona.
O MPLA, Movimento Pela Libertação de
Angola, é comandando por dos Santos e já contou até com apoio de Cuba,
que enviou milhares de soldados ao país para ajudá-lo a resistir à
intervenção sul-africana e implementar sua própria visão de revolução
socialista. Angola enfrentou anos de guerra civil, o que levou o país a
se tornar um dos mais desiguais e pobres do continente, apesar das
imensas reservas de petróleo que têm propiciado seu crescimento recente.
Aproximadamente 36% da população do país vive em situação de extrema
pobreza, recebendo menos de US$ 2 por dia. Em nenhum outro país do
planeta a taxa de mortalidade infantil é tão alta.
Quase como um símbolo da desigualdade
que aflige o país africano, dos Santos ergue na periferia da cidade uma
das maiores residências do continente. Atualmente, residem no local a
mãe e os filhos do presidente (uma vez que ele próprio reside no palácio
oficial). Próximo ao mar, a suntuosa residência fica exatamente ao lado
da rodovia “Estrada da Samba”.
Algum palpite da empreiteira responsável
pela urbanização da rodovia? Pois é, ela mesma, a Odebrecht. E quem
financiou a obra? Encare a sua carteira e veja se não estão faltando R$
2,84, pois este é o exato valor que cada brasileiro formalmente
empregado contribuiu para financiar a obra, que contou com US$ 91.7
milhões em financiamento fartamente subsidiado pelo BNDES.
0 Comentários