Ter imunidades não significa estar à margem do estado de emergência

Ter imunidades não significa estar acima da Constituição, muito menos estar à margem do estado de emergência. A ideia defendida publicamente é a de que aos Juízes não se aplica a restrição à liberdade de circulação, alegadamente por serem “titulares” de órgãos de soberania.
Ora, os direitos e imunidades dos membros dos órgãos de soberania (art. 58/5/b) continuam salvaguardados em estado de emergência para todos aqueles que beneficiam do referido estatuto (imunidades).

Tanto assim é que, mesmo em serviços mínimos, os Juízes continuam a poder desempenhar as suas funções em modo de teletrabalho ou presencialmente, assim como continuam a ser respeitadas, asseguradas e protegidas todas aquelas garantias enumeradas no art. 179º. No essencial aquela disposição garante aos Juízes a sua independência, a inamovibilidade, a não responsabilidade pelas decisões que proferem no exercício das suas funções e a prisão apenas depois de culpa formada. São estas as garantias que decorrem das imunidades dos Juízes.
O estado de emergência não beliscou nenhuma daquelas garantias ou prerrogativas conferidas aos Juízes no art. 179º.

Pretender sair da província de Luanda – sujeita a um cerco sanitário no âmbito do estado de emergência – não se enquadra de modo algum na ressalva feita pelo nº 5, do art. 58º. Pretender-se que a restrição de circulação não seja aplicada aos Juízes – com fundamento na alínea b), do nº 5, do art. 59º – é um raciocínio inquinado pelo que podemos chamar de “traumas da primeira infância”, sendo esta “primeira infância” o primeiro ano do curso de Direito onde se ministra pela primeira vez (e para muitos a única vez) a cadeira de Direito Constitucional.

Quando se alega que o Juiz (ou o Deputado) não está sujeito à limitação do direito de circulação, supostamente por ser titular de um órgão de soberania, está-se a subverter o regime constitucional do estado de excepção. É preciso não esquecer que, tal como ensina Gomes Canotilho, “O direito de necessidade constitucional não é um direito fora da Constituição, mas sim um direito normativo-constitucionalmente conformado”.

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Ser titular (ou ser membro) de um órgão de soberania não significa estar à margem ou acima da lei! Todos devem cumprir a Constituição, as leis e seus regulamentos. Esta é a essência do Estado de Direito, que decorre das disposições combinadas do art. 2º, art. 6º, art. 8º, art. 23º, nº 1, art. 28, art. 58º e art. 226º. Se não percebermos o Estado de Direito também teremos dificuldade de perceber o estado de emergência. Portanto, não é correcta a interpretação de que a alínea b), do nº 5, do art. 58º torna os Juízes “imunes” à restrição de circulação ou ao estado de emergência em geral.
Com tanta confusão de conceitos e de compreensão jurídica à volta do estado de emergência, estamos, claramente, perante uma situação em que todos nós –Professores de Direito, Juízes, Procuradores, Advogados e demais Juristas – precisamos de recostar-nos no divã da Psicanálise para que um discípulo de Sigmund Freud ou de Carl Gustav Jung, em sessões, identifique traumas da primeira infância do estudo do Direito e nos cure do stresse pós-traumático da nossa exposição ao Estado de Direito em construção.

Por: António Paulo Professor da cadeira de Ciência Política e Direito Constitucional (Universidade Agostinho Neto).

Saiba mais sobre este assunto, clicando neste link https://youtu.be/vnZGHtNCpXE

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