ADMINISTRADORA MUNICIPAL DESOBEDECE AO TRIBUNAL



A administradora municipal do Kilamba Kiaxi, Naulila André, ordenou a demolição de um empreendimento comercial de quatro lojas e uma residência que estava a ser concluído no Bairro Nova Vida. A acção avançou com o apoio de força policial e com a directora do gabinete jurídico, Sílvia Cristóvão, a assistir numa cadeira. Em poucas horas, Walter Faustino perdeu um investimento de mais de 300 milhões de kwanzas. Tudo isto em directo desrespeito pela ordem do Tribunal da Comarca de Belas, que ordenara a suspensão da demolição.

A 17.ª Cimeira de Negócios Estados Unidos da América – África decorrerá, nos próximos dias, num país onde não há qualquer tipo de segurança jurídica para os cidadãos e empreendedores que não detenham o poder ou o magistério da influência do momento: Angola.


O Maka Angola traz a lume o mais recente caso de insegurança jurídica e abuso de poder, demonstrando como as decisões judiciais podem ser desautorizadas ou ignoradas pela administração pública caso não sejam acompanhadas de “ordens superiores”. É o Estado da desordem.


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A 6 de Junho passado, a administradora municipal do Kilamba Kiaxi, Naulila André, ordenou a demolição de um empreendimento comercial de quatro lojas e uma residência de dois pisos, que estava a ser construído no Bairro Nova Vida, junto ao supermercado Kero. A acção de demolição, com apoio de força policial, decorreu das 17h00 às 21h00, na presença da directora do gabinete jurídico da referida administração municipal, Sílvia Cristóvão.


A SUSPENSÃO DO TRIBUNAL


Nesse mesmo dia, no período da manhã, o juiz Delson Magalhães, da Sala do Cível do Tribunal da Comarca de Belas, ordenou à administração municipal do Kilamba Kiaxi a suspensão da demolição da referida propriedade, pertencente ao empreendedor Walter Ruben António Faustino. Trata-se do Processo n.º 086/2025-B, cuja certidão de citação, exarada pelo juiz, concedeu oito dias à administração municipal do Kilamba Kiaxi para contestar, nos autos, a providência cautelar que lhe foi movida pelo empreendedor, findos os quais decidiria a favor do requerente.


Segundo dados recolhidos pelo Maka Angola, quer a administradora Naulila André, quer a sua directora jurídica, Sílvia Cristóvão, recusaram-se a acatar a decisão do juiz e, já fora das horas normais de expediente, decidiram avançar com as demolições. Por sua vez, o comandante da Esquadra Policial do Nova Vida, superintendente-chefe Isaías Salvador Bernardo, leu a citação do juiz horas antes das demolições, mas decidiu enviar força policial para desautorizar a ordem do tribunal, protegendo cabalmente os demolidores.


A JUSTIFICAÇÃO DE KILAMBA KIAXI


Em declarações à Rádio MFM, transmitida ontem, a directora do gabinete jurídico da administração municipal, Sílvia Cristóvão, justificou o acto: “A demolição foi realizada na sequência de um processo de contra-ordenação que foi aberto em virtude de se ter constatado que o munícipe violava a licença que foi emitida em seu benefício.”


Segundo a responsável, Walter Faustino recebeu uma licença para a construção de lojas, mas “o munícipe construiu casa e muros de vedação. Essa violação constitui uma transgressão urbanística à luza da alínea B do n.º 1 do artigo 70 do Decreto 80/06, que é o Regulamento das operações de loteamento, obras de urbanização e obras de construção”. Naulila André especificou que a atitude do empreendedor “também constitui uma contra-ordenação à luz da alínea C do artigo 12 da Postura nº 66/24, que regulamenta a Lei das Contra-Ordenações no município do Kilamba-Kiaxi”.


Mais afirmou que, por diversas vezes, o infractor foi notificado para suspender as obras, por violação dos termos da licença emitida para o efeito e, por desobediência, Walter Faustino continuou a construir por sua conta e risco. Sílvia Cristóvão garante que o visado “foi pontualmente notificado das demolições”.


Naulila André emitiu o alvará de licença de construção do edifício comercial (n.º 070/ADMKK/2024) a 24 de Julho de 2024, a favor de Walter Faustino. Ou seja, permitiu a construção e mandou demoli-la. 


No documento para aprovação da licença, o director municipal de infra-estruturas, ordenamento do território e habitação, Eduardo Nsiasoque, certificou que “o projecto em causa cumpriu com as normas e regulamentos de edificações urbanas” e referiu ter obtido os pareceres técnicos favoráveis para o efeito. 


Da área total de 2368 metros quadrados, o projecto aprovado contemplava uma área de construção de 896 metros quadrados no primeiro piso e a mesma área e construção no segundo piso. Para a obtenção da licença, o cidadão pagou aos cofres do Estado mais de um 1,7 milhões de kwanzas, conforme nota de liquidação oficial.


MULTA AO INFRACTOR


Todavia, a 29 de Dezembro de 2023, a direcção municipal de fiscalização e inspecção das actividades económicas e segurança alimentar do Kilamba Kiaxi autuou Walter Rubem Fonseca por ter iniciado a construção do seu empreendimento de quatro lojas, incluindo uma casa para habitação, sem a devida licença. Como punição, o proprietário pagou uma multa de 3,5 milhões de kwanzas.


Adiante, a 21 de Fevereiro passado, a administração do Kilamba Kiaxi deslocou-se à referida obra e simplesmente escreveu numa das paredes “GPL admin-K. Kiaxi obra suspensa” e a data, bem como confiscou os materiais de construção.


De acordo com o analista legal do Maka Angola, Rui Verde, “a existência de uma contra-ordenação esgota-se em si própria. É levantada e paga, assunto terminado. Pode dar origem a outros procedimentos, mas esses não são automáticos, e têm de seguir os seus trâmites”.


ORDEM DE DEMOLIÇÃO VOLUNTÁRIA


A 14 de Abril, o director de fiscalização de Kilamba Kiaxi, José Lourenço da Silva, emitiu o auto de demolição n.º 003/2025 contra Walter Faustino, instando-o a “proceder voluntariamente” com a demolição da estrutura erguida “à margem da licença”. Ou seja, ou auto instava-o a demolir apenas a casa. 


O segundo ponto do referido auto determinava que, se Walter Faustino não procedesse à demolição voluntária da parte ilegal da construção (a casa), a direcção de fiscalização cumpriria com a ordem de demolição da administradora Naulila André exarada no Despacho n.º 40/GAB.ADM.KK/2025 – neste caso, e apesar de o auto não ser explícito, a demolição aparentemente abrangeria a totalidade da construção (visto que a demolição que o município levou avante foi efectivamente total, e não apenas da parte ilegal) e seria feita “às expensas” do visado.


O acto administrativo de demolição fundamentou-se no facto de Walter Faustino ter “abusado” da licença de construção, e é esse "abuso" que parece ser o objecto de fundo da acção administrativa. Porém, de acordo com a lei, esse acto de demolição só “poderia ocorrer a seguir à providência cautelar” intentada pelo lesado. Perante a providência cautelar emitida pelo tribunal, o município não poderia ter avançado com a demolição. “Portanto, tudo se reconduz à providência cautelar e à citação da sua existência e seus efeitos”, nota Rui Verde. 


De acordo com o Código do Processo do Contencioso Administrativo, no seu artigo 138.º (proibição de executar o acto):

“1. Requerida a suspensão da eficácia de um acto, a Autoridade Administrativa, recebido o duplicado do requerimento respectivo, não pode iniciar ou continuar a execução do mesmo e deve impedir, com urgência, que os serviços e outros interessados procedam ou continuem a proceder a ela.

2. Pode, porém, a Autoridade Administrativa iniciar ou retomar a execução se, por despacho fundamentado, reconhecer expressamente, no prazo de 7 (sete) dias, que o diferimento da execução seria gravemente prejudicial para o interesse público.”


Em relação ao n.º 2 do referido artigo, não há qualquer indicação de que este despacho tenha sido produzido e junto aos autos no prazo de sete dias.


Como adianta Rui Verde, nesse caso, aplica-se o n.º 6 do citado artigo 138º, segundo o qual “incorre em responsabilidade civil, disciplinar e criminal, nos termos gerais, a Autoridade Administrativa ou o agente que promover a execução do acto ou o executar, violando o disposto no presente artigo”.


Sílvia Cristóvão argumentou, em entrevista à MFM, que a fiscalização não ignorou a providência cautelar. “É muito importante que se esclareça que a interposição de uma providência cautelar não suspende automaticamente a execução de um acto administrativo. Isso só ocorre após a citação e, ao longo de toda a demolição, não tivemos notícia da existência da citação.”


E foi mais longe: “Também é importante dizer que a citação não é feita na rua e muito menos pelo requerente e sim por um oficial de justiça na sede da requerida. Não percebemos como a citação foi parar às mãos do infractor. O tribunal não nos citou até ao momento em que terminámos a demolição.”


Apesar da sua eloquência, Sílvia Cristóvão mentiu sem qualquer pudor. A 6 de Junho, um oficial de justiça, Alfredo Cajesse, entregou a citação na sede da administração municipal do Kilamba Kiaxi. A referida instituição estampou o seu carimbo (recebido) no duplicado da certidão de citação, que foi devidamente assinado por um ou uma funcionária de sobrenome Silva, que assinou o documento e anotou a data de 6 de Junho.


Como é do conhecimento público, a função pública funciona até às 15h00. A demolição da propriedade de Walter Faustino começou perto das 17h00, como atestam várias testemunhas, e foi pessoalmente dirigida pela directora do gabinete jurídico, Sílvia Cristóvão, que se fez presente no local, com a sua cadeira, para comandar o espectáculo.


CONCLUSÃO


O incumprimento de decisões judiciais é extremamente grave, além de ser um crime: o crime de desobediência. O Artigo 340.º do Código Penal Angolano estabelece que quem não cumprir ordens legítimas de autoridades ou funcionários competentes pode ser punido com prisão. Se a ordem descumprida for para dar seguimento a uma decisão judicial, ou houver advertência explícita sobre a criminalidade do acto, essa punição aplica-se expressamente.


Mas o problema é superior ao crime. Trata-se de uma violação expressa da ordem constitucional e do Estado de Direito. Inaceitável. 


O incumprimento de decisões judiciais por autoridades públicas angolanas viola gravemente o funcionamento do Estado de Direito. As leis existem para garantir justiça e equidade, e a desobediência por parte daqueles que deveriam zelar por sua aplicação mina a credibilidade das instituições. Quando um funcionário ou autoridade ignora uma ordem judicial, cria-se um precedente perigoso de impunidade, incentivando outros a seguirem o mesmo caminho. Isso enfraquece o sistema judiciário e leva à desconfiança da população em relação à justiça, um pilar essencial para a estabilidade social. 


No final, estas situações afastam o investimento, os contratos, mantêm o país num círculo vicioso de pobreza e miséria, sem fim, sem esperança.


Além disso, esta prática abre portas para abusos de poder e arbitrariedades. O respeito das decisões judiciais é o que impede que os interesses políticos ou pessoais se sobreponham ao que é justo e legal. Quando uma ordem judicial não é cumprida, especialmente por aqueles que detêm autoridade, há um grave desrespeito pelas garantias fundamentais dos cidadãos. Se cada um faz o que quer, é a lei da selva. Todos à pancada. É isso que se pretende?


Por fim, a desobediência institucionalizada pode levar a um colapso da ordem legal. Se a população percebe que aqueles que estão no poder não seguem as regras, pode instalar-se o caos jurídico e social, tornando-se cada vez mais difícil fazer valer os direitos dos cidadãos. O respeito das decisões judiciais não é opcional, é um dever fundamental que sustenta a legitimidade e o equilíbrio do Estado. A impunidade de autoridades que desobedecem a determinações judiciais é uma ameaça directa à governabilidade e ao próprio futuro do país. Não haja dúvidas sobre isso. Não há cimeira de negócios com os Estados Unidos que valha, quando o caos espreita à janela.

Maka Angola 


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