Desespero Urbano e a Esperança no Interior- Sousa Jamba



Em Luanda, tornou-se quase um refrão recorrente: “As rendas estão pela hora da morte.” E o que mais revolta muitos cidadãos é que grande parte desses imóveis a preços exorbitantes são, na verdade, apartamentos construídos com fundos públicos — habitação social, supostamente destinada a apoiar os que mais precisam. O fenómeno é simples: um beneficiário paga uma renda simbólica de 30 mil kwanzas por mês e, sem qualquer controlo, subarrenda o mesmo imóvel por 300 mil ou mais. Este tipo de especulação criou um mercado paralelo que subverte por completo os princípios da justiça social.


Mas esta prática, embora escandalosa, é apenas um sintoma de um problema mais profundo: a crise estrutural da habitação em Angola. O crescimento urbano acelerado, sem o devido planeamento, deixou as cidades — sobretudo Luanda — à beira do colapso habitacional. A capital foi pensada, durante o período colonial, para cerca de 300 mil habitantes. Hoje, abriga quase oito milhões, muitos deles em condições indignas, sem acesso a água potável, saneamento, nem segurança jurídica sobre o espaço onde vivem.


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O Estado angolano reconheceu este desafio e traçou metas ambiciosas através do Programa Nacional de Urbanismo e Habitação, que previa a construção de um milhão de casas. Contudo, até 2024, foram entregues apenas cerca de 220 mil. A procura por habitação continua a superar em larga escala a oferta disponível, e o mercado reage com aquilo que se esperaria: aumento vertiginoso dos preços. É a lei da oferta e da procura aplicada sem amortecedores sociais.


No entanto, é possível inverter este ciclo. Angola não é um país sem recursos. Dispõe de uma das maiores reservas de petróleo do continente, possui infraestruturas logísticas relevantes — com portos como os de Luanda, Lobito e Namibe — e conta com um sector da construção civil que representa mais de 15% do PIB. Para além disso, está a dar passos promissores na introdução de tecnologias inovadoras no sector habitacional.


Em 2023, Angola tornou-se o primeiro país africano a construir uma casa com tecnologia de impressão 3D. O projecto, desenvolvido pela empresa Power2Build, em parceria com a dinamarquesa COBOD, conseguiu erguer uma habitação com 140 metros quadrados em apenas 30 horas, usando 99% de materiais locais. Este avanço representa uma revolução silenciosa com enorme potencial de replicação em larga escala, sobretudo em zonas periurbanas e rurais, onde os custos logísticos e de materiais são tradicionalmente elevados.


No plano internacional, há modelos que Angola pode adaptar com inteligência. A Finlândia é o exemplo mais citado graças à sua política “Housing First”, que parte do princípio de que oferecer uma casa sem pré-condições — e só depois apoiar com serviços sociais — é mais eficaz e económico do que manter pessoas em situações precárias. Esta abordagem reduziu drasticamente o número de sem-abrigo e revelou-se financeiramente sustentável.


Em cidades como Seattle e Cambridge, são utilizadas microcasas e módulos habitacionais, construídos rapidamente, a custos acessíveis, com impacto positivo em termos de saúde mental e reinserção social. Em Los Angeles e Atlanta, contentores marítimos estão a ser convertidos em complexos habitacionais com todas as comodidades básicas — uma solução prática que pode ser interessante para Angola, dada a sua extensa rede portuária e o fácil acesso a contentores usados.


Mas para além da tecnologia e das políticas públicas, há uma lição essencial a reter: não basta construir casas; é preciso reconstruir comunidades.


O falecido empresário Segunda Amões teve uma visão que permanece atual: revitalizar a economia das aldeias e dos municípios como forma de conter o êxodo rural e equilibrar o crescimento urbano. A sua ideia era clara — se houver oportunidade, dignidade e serviços nas zonas do interior, as pessoas não terão que migrar em massa para as cidades. Isso exige mais do que cimento e tijolos: requer escolas com qualidade, centros de saúde funcionais, conectividade digital, formação profissional, cultura, e sobretudo, investimento que respeite o tecido social local.


O interior de Angola tem riquezas que vão para além do petróleo e dos diamantes. Há rios, terras férteis, paisagens de cortar a respiração e comunidades com história, saberes e resiliência. Com visão estratégica, estas regiões podem acolher projectos de habitação inovadores, associados a actividades económicas sustentáveis: agricultura regenerativa, turismo rural, processamento local de produtos, ou até pequenas indústrias mineiras responsáveis.


A solução para a crise da habitação não está apenas em construir mais em Luanda. Está em repensar o próprio modelo de desenvolvimento urbano e territorial. Está em devolver às famílias a possibilidade de escolher onde viver — sem serem obrigadas a escolher entre miséria na cidade e abandono no campo.


Angola tem hoje, mais do que nunca, a oportunidade de transformar esta crise numa viragem histórica. Com coragem política, boa governação, e parcerias inteligentes com o sector privado e internacional, o país pode tornar-se uma referência continental em soluções habitacionais acessíveis, sustentáveis e justas.


Porque viver com dignidade — seja no centro de Luanda ou à beira de um rio no Bié — deve ser um direito, não um privilégio.


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