O Fly Podcast: Um Combate Linguístico na Arena Anglófona de Angola- Sousa Jamba



Na arena suada e cacofónica do Fly Podcast, o mais recente episódio desenrolou-se como uma telenovela linguística, recheada de debates inflamados, egos feridos e um QR code de um patrocinador de telecomunicações que pairava sobre a discussão como uma divindade digital. Apresentado pelo carismático Fly ( um rapper reformado com um talento inato para alternar entre o português e o inglês com a mestria de um DJ a riscar vinil)  o podcast prometia uma imersão profunda no estado da língua inglesa em Angola. O que ofereceu, contudo, foi um simpósio gloriosamente caótico onde três professores de inglês (Uncle Ben, Poliglota Line e Teacher Eric) se confrontaram sobre pedagogia, pronúncia e inimizades pessoais, deixando o publico  sem saber se estavam perante uma lição de línguas ou um episódio kuyante de reality show.


O episódio começou com Fly, um homem que parece ter aprendido inglês por osmose em batalhas de rap americanas, a abrir com um monólogo que misturava charme e desordem em igual medida. “Sentiram a minha falta? E eu, o que perdi?”, perguntou ele, com uma voz que fundia a ginga de Luanda com a ousadia da MTV, enquanto promovia os patrocinadores do programa ( a Unitel e a BantuBet) com o fervor de um pregão carnavalesco. A aplicação My Unitel, declarou ele, estava a “revolucionar” a forma como os angolanos se mantêm conectados, uma afirmação repetida com tal entusiasmo que se poderia pensar que estava contratualmente obrigado a dizer “My Unitel” a cada três frases. Um QR code cintilava no ecrã, presumivelmente para conduzir os ouvintes a uma utopia digital de pacotes de dados acessíveis, mas a sensação era mais de estar num concurso televisivo distópico.


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Entram em cena os convidados: Uncle Ben, um professor cujo sotaque britânico impecável poderia fazer inveja a um locutor da BBC; Poliglota Line, cujo inglês com inflexão americana transbordava da cadência de Lil Wayne e Chris Brown; e Teacher Eric, um elemento imprevisível cujo sotaque desafiava qualquer categorização, oscilando entre o orgulho angolano e um limbo linguístico. Supostamente ali para discutir o estado do ensino da língua inglesa em Angola, os três rapidamente mergulharam num verdadeiro combate verbal, onde cada um brandia a sua expertise como uma arma contundente.

Uncle Ben, o estadista do trio, que faz lembrar um tesoureiro dos Testemunhas de Jeová,  começou com um otimismo contido, declarando que o inglês em Angola estava “de boa saúde” — afinal, até a app My Unitel tem nome em inglês. Relatou auditórios cheios em eventos dedicados à língua inglesa, sugerindo que Luanda é praticamente um viveiro de fluência anglófona. “My Unitel”, disse ele, como se o nome da aplicação fosse por si só prova de progresso linguístico. As suas histórias como intérprete de Kamala Harris e Donald Trump (presumivelmente para a televisão angolana) conferiram-lhe certa gravitas — mas essa serenidade não duraria muito.

Poliglota Line, com a confiança de quem aprendeu inglês a ouvir rap compulsivamente, contrapôs com uma visão mais pragmática. Argumentou que a proficiência em inglês em Angola não se mede por seminários lotados, mas pela aplicação prática — cultivada através da música e do cinema. O seu método, revelou, passava por pausar batalhas de rap para anotar frases como “I’m a bitch or ass” (pérola mal interpretada e posteriormente corrigida pelo Google), um processo que mais parecia uma expedição linguística à Indiana Jones. O seu sotaque americano era tão convincente que Fly confessou tê-lo confundido com um nativo do “gueto”, um elogio que Poliglota aceitou com um sorriso de quem já o ouvira antes.


E então surge Teacher Eric, o provocador, que entrou no debate como um justiceiro linguístico. Declarou o ensino do inglês em Angola como “péssimo”, citando o facto de que, apesar de anos de escolaridade, muitos alunos mal conseguem formular frases básicas. O seu dado — de que menos de 1% dos 35 milhões de angolanos falam inglês — caiu como um cocktail molotov, especialmente considerando que a visão optimista de Uncle Ben dependia da ideia de que de Luanda a Cabinda todos andam a lançar “how are yous” como se fossem confettis. Mas a crítica de Eric não se ficou pelos números: era pessoal. Acusou os colegas de estarem “perdidos no mapa”, presos a métodos arcaicos como a tradução gramatical — um fóssil dos tempos do latim e do grego. “Estás a ensinar fonologia a angolanos?”, troçou ele, como se Uncle Ben estivesse a vender gelo a pinguins.

O debate tornou-se verdadeiramente teatral quando Eric revelou uma rixa mal resolvida com Poliglota, originada de uma zanga nas redes sociais em 2022, onde Poliglota o apelidou de “mentiroso” por causa de uma lição sobre o verbo to be. A mágoa de Eric ia além da gramática; era uma questão de honra. A sua voz elevava-se enquanto exigia que Poliglota justificasse a sua afirmação de que “how old are you” se traduz como “quantos anos tens” e não “eu tenho X anos”. Poliglota, imperturbável, manteve a posição: defender que os alunos devem reproduzir contracções nativas (como “I’m” em vez de “I have”) é crucial para a fluência — mesmo que isso implique mergulhar no caos melódico de Justin Bieber e o seu “My Mama Don’t Like You”. Uncle Ben, por seu lado, pairava acima da contenda, com a serenidade fleumática do seu sotaque britânico em nítido contraste com o drama em crescendo.


O clímax do podcast chegou quando Eric desafiou a alegação de Poliglota de ensinar fluência em seis meses — uma promessa que supostamente vira em panfletos. Poliglota negou com a indignação de quem é acusado de roubar a password do Wi-Fi alheio. “Mostra-me o panfleto!”, exigiu, enquanto Fly tentava manter a ordem, os seus apelos à civilidade abafados por acusações de “treta” e métodos “básicos”. Num momento de bravata surreal, Eric propôs uma aula de inglês improvisada com um membro aleatório da audiência, apenas para rejeitar a escolha de Fly — um amigo chamado Valdemar — por parcialidade. Valdemar, rapper de batalha com formação sul-africana, acabou por participar, oferecendo uma perspectiva serena: “Não tenho de provar o meu inglês a ninguém”, disse, com a calma de um mestre zen que acabou de tirar 120 no TOEFL.

No final, o podcast assemelhava-se a uma West Side Story linguística: Fly como o moderador exasperado, Uncle Ben como a voz da razão, Poliglota como o showman apaixonado e Eric como o cruzado ressentido. O debate sobre o inglês em Angola — os seus desafios, progressos e nuances culturais — perdeu-se entre farpas pessoais e posturas pedagógicas. E, no entanto, no meio do caos, emergiram pepitas de sabedoria: o foco de Uncle Ben na pronúncia padrão, a defesa de Poliglota pela aprendizagem imersiva via cultura pop, e a insistência de Eric na necessidade de enfrentar falhas sistémicas na educação. Até o omnipresente QR code da My Unitel parecia piscar o olho à audiência, como quem diz: “Fiquem ligados — este drama vale o vosso pacote de dados.”


À boa maneira Angolana, sai-se do Fly Podcast ao mesmo tempo entretido e exausto, a admirar a paixão dos professores de inglês angolanos enquanto se pergunta se algum dia chegarão a um consenso sobre como se diz “shit” corretamente. Por agora, o estado do inglês em Angola continua em construção — tal como o próprio podcast: um testemunho vibrante e desordenado de um país que tenta domar uma língua global, um debate acalorado de cada vez.


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