Os vídeos que circulam sobre a supermodelo angolana Maria Borges e o seu marido, Perikles Mandinga, revelam uma verdade brutal: vê-se um homem jovem, de corpo trabalhado em ginásio, a discutir com uma familiar. Vê-se esse mesmo homem, segundo Maria Borges, a agredi-la fisicamente na América e em Portugal. Vê-se a sua amante instalada numa casa comprada pela modelo, usando os perfumes, as roupas, o conforto pago pelo trabalho dela. Vê-se, agora, esse homem a recusar o divórcio, a não ser que receba uma fatia enorme dos rendimentos que ela acumulou. Estamos a testemunhar, em tempo real, o desmantelamento metódico de uma mulher bem-sucedida por um homem mantido. E há muitos jovens homens mantidos; é um fenómeno cada vez mais comum, não só em Angola, mas também em África e na diáspora africana.
Maria Borges desfilou para a Victoria’s Secret, esse território máximo da fantasia feminina, onde a roupa íntima é apresentada como instrumento de poder. Tudo sugere que, por detrás do palco, ela viveria encontros sublimes em ilhas tropicais com homens impecáveis. Em vez disso, segundo o seu próprio testemunho, o que havia eram murros, gritos, pontapés, medo. Uma intimidade tão brutal e repugnante como aquela que se consome em motéis de beira de estrada, com seringas espalhadas, mulheres dependentes e humilhadas.
Compare-se este homem com os Mbunda do leste de Angola. Guerreiros da mata, tão hábeis que os traficantes de escravos os detestavam, recusavam-se a comprá-los porque sabiam que, uma vez desembarcados nas Américas, acabariam por desaparecer. Alguns preferiam atirar-se ao mar a aceitar a vida de escravo. São homens de orgulho feroz, que não engolem insultos com facilidade; porém, se formos à aldeia deles, não nos deixam morrer. Alimentam-nos, acolhem-nos, desde que sejamos respeitosos. Nesse equilíbrio entre orgulho e hospitalidade, entre firmeza e generosidade, vê-se o tipo de caráter masculino que faz falta e que nenhuma câmara de ginásio conseguirá fabricar.
Perikles Mandinga não tem vergonha de bater numa mulher porque é profundamente vazio. Cultiva músculos, não caráter. Passa horas no ginásio para esculpir o corpo, mas quase nada faz para trabalhar a substância interior. De forma semelhante, muitas mulheres deixam-se atrair por estas figuras que podem exibir em festas, como troféus, como namorados-espetáculo.
Neste homem mantido o que primeiro sobressai não é a força, mas um traço glacial: a indiferença ao insulto, essa espécie de anestesia moral que, pouco a pouco, se aproxima da psicopatia; a mente parece-lhe revestida de uma couraça espessa, impermeável à humilhação. Não se trata, em rigor, de um homem orgulhoso no sentido nobre da palavra; trata-se, antes, de alguém a quem falta brio, a quem falta até o sobressalto mínimo diante da injúria. Aceita tudo, engole tudo, suporta tudo. Nas gravações escuta-se a voz que o crava na fórmula insultuosa «broke ass nigger»; nenhum homem que se respeite, nenhum homem com coluna vertebral moral, permaneceria nesse lugar. Nas mesmas gravações ordenam-lhe que abandone o apartamento; ainda assim, fica.
No Ocidente vejo o mesmo padrão: mulheres altamente bem-sucedidas ligadas a homens menos realizados, que se transformam em guarda-costas glorificados, cujas funções se estendem até à cama. Enquanto a mulher cresce, expande redes, acumula capital, o homem fica parado. Quando essa é a única função, procuram compensar multiplicando encontros sexuais com outras mulheres, para se convencerem de que há qualquer coisa de irresistível neles.
Inevitavelmente, tornam-se agressivos em relação à sua benfeitora. O homem quase já não se interessa por ela, porque satisfaz os seus impulsos fora de casa, mas mantém-se como figura presente, sombra e fardo. Muitas mulheres, sobretudo as mais criativas ou com alguma fragilidade psíquica, tornam-se particularmente vulneráveis a este tipo de homem. Ficam fascinadas por figuras que parecem fortes, difíceis. Muitas cresceram sem uma verdadeira figura paterna; falta-lhes um modelo masculino que não seja de violência ou ausência. Quanto mais duro e intratável ele parece, mais sedutora se torna a fantasia de o transformar. É nessa fantasia que demasiadas mulheres brilhantes perdem anos de vida.
Todo este sofrimento raramente é exposto na praça pública. A mulher sente vergonha, teme o olhar incrédulo de quem não concebe que aquela figura glamorosa esteja a sofrer como qualquer outra. O monstro com quem ela vive é exímio em controlar a sua própria imagem. Encena humildade, simpatia, devoção. São verdadeiros peritos em psicologia instintiva. Se há um talento que os distingue, é a capacidade de manipular mulheres.
Eles conhecem as fragilidades. Percebem onde dói, onde falta aprovação, onde a autoestima falha. Podem ter ao lado mulheres lindíssimas a desfilar em passadeiras de luxo, mas, por detrás dessas figuras, há seres humanos frágeis, a suspirar por afeto, por validação. Esses homens aprendem a dar-lhes, num momento, a ternura que elas querem ouvir e, no instante seguinte, transformam-se em monstros, alternando mimo e crueldade até deixarem essas mulheres completamente confundidas. Procuram isolá-las, arrancá-las das redes de amigas, afastá-las da família, minar qualquer estrutura que lhes possa servir de abrigo.
No caso de Maria Borges, tudo indica que houve um ponto de rutura em que irmãs, amigos, uma rede de afetos femininos se ergueram em sua defesa. Para estes predadores, a entrada da família é sempre um problema, porque vivem de isolamento, de quartos trancados, de segredos. Quando a comunidade entra, a mentira começa a rachar.
Por isso, nomeio Perikles Mandinga pelo que é: predador, parasita, monstro emocional. E pergunto: quantas outras Marias -há por aí, escondidas atrás de sorrisos profissionais, esperando que alguém lhes diga que não estão loucas, que não estão sozinhas, que podem sair?
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