Movimentam-se as peças para as eleições gerais de 2027, e o primeiro gesto foi a contestação à Comissão Nacional Eleitoral (CNE) e ao seu presidente, o juiz Manuel Pereira da Silva “Manico”.
O principal partido da oposição, UNITA, tentou impedir a tomada de posse de “Manico” através de uma providência cautelar, que foi indeferida pelo Tribunal Constitucional.
Temos dúvidas sobre esse indeferimento liminar, que se baseou na ilegitimidade da Assembleia Nacional como parte. Segundo o Tribunal, o papel do parlamento é apenas instrumental, atribuindo eficácia a um acto do Conselho Superior de Magistratura Judicial (CSMJ). É ao CSMJ que cabe a atribuição de validade à designação do presidente da CNE e a elaboração do regulamento de escolha do presidente, cuja inconstitucionalidade foi suscitada. Portanto, deveria ter sido demandado o CSMJ.
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Não se concorda com esta posição do Tribunal. Na verdade, o acto de posse em cargo público pode ser impugnado junto da autoridade responsável por conferi-lo, sempre que haja ilegalidades que comprometam sua validade. A relevância dessa possibilidade resulta da protecção dos princípios da legalidade e da boa administração, assegurando que a posse seja concedida em conformidade com o ordenamento jurídico e com os interesses públicos. A posição tomada pelo Tribunal menoriza, além do mais, a Assembleia Nacional face ao CSMJ, o que é inaceitável do ponto de vista constitucional. Contudo, não vale a pena perder mais tempo com o tema, uma vez que a decisão está, tanto quanto se sabe, solidificada na ordem jurídica, dado que a UNITA não recorreu.
Depois, disto começou a discussão sobre a alteração das leis eleitorais. Há duas versões, a proposta pelo Presidente da República e a da UNITA. Ambas foram aprovadas na generalidade na Assembleia Nacional, e estão em discussão na especialidade, isto é, nos detalhes. Refira-se que a UNITA se absteve em relação à proposta do Presidente da República. Não votou contra. É um bom sinal, um sinal de que é possível o diálogo, e o eventual encontro de uma plataforma consensual.
A grande divergência continua a ser a CNE e o seu papel no apuramento e publicação dos resultados das eleições. A oposição não confia na CNE e no seu presidente, pelo que pretende que se façam mudanças essenciais na instituição.
O artigo 7.º do projecto da UNITA propõe que a CNE continue formada por 17 membros, incluindo o presidente e o vice-presidente. A composição é que seria alterada da seguinte maneira: cada grupo parlamentar indicaria dois membros; além disso, um jurista ou juiz de reconhecido mérito seria seleccionado por concurso promovido pela Assembleia Nacional. Os demais membros viriam da sociedade civil, sendo um deles o presidente, conforme estipulado na lei.
Todos os membros seriam eleitos pelo plenário da Assembleia Nacional, necessitando de maioria absoluta dos deputados em funções.
O presidente seria escolhido pelos membros da CNE através de um concurso público promovido pela Assembleia Nacional, os quais seleccionariam, de entre os comissários da sociedade civil, três candidatos com os melhores currículos. Esses três candidatos passariam por uma votação secreta entre seus pares no plenário, sendo eleito presidente aquele que recebesse mais votos, enquanto o segundo mais votado assumiria funções de vice-presidente.
O certo é que este projecto da UNITA não lhes resolve nada, nem retira a cariz de “mini-parlamento” de que a UNITA discorda. Basta fazer um exercício simples com a actual composição da Assembleia Nacional. Há três grupos parlamentares: MPLA, UNITA e Misto. Cada grupo elegeria dois membros, num total de seis membros. Os restantes 11 membros seriam sempre resultado de uma deliberação da maioria absoluta dos deputados (o MPLA tem maioria absoluta). Consequentemente, não era difícil um cenário em que o MPLA passasse a ter simpatias de 13 membros da CNE…
Se entendemos bem o projecto da UNITA, trata-se de um verdadeiro “tiro no pé”! Mais cedo do que tarde, a UNITA iria alegar que os membros da sociedade civil eleitos pela maioria absoluta da Assembleia eram, afinal, amigos do MPLA….
Outras correntes têm defendido a instituição de um tribunal eleitoral à semelhança do que acontece no Brasil. Facilmente, se percebe que no contexto angolano tal levaria à habitual acusação de que os juízes obedeceriam a “ordens superiores” e nada ficaria resolvido. Também se tem alegado que uma total informatização do sistema, desde o voto electrónico até à contagem digital de votos, levaria a uma plena objectividade e confiança nos resultados. No entanto, outros alegariam que forças obscuras conseguiriam entrar no sistema e alterar os algoritmos, não permitindo credibilizar os resultados. Dificilmente sairemos deste círculo vicioso. Para cada solução institucional surgem críticas, e dificilmente há resultados que a todos contentem. Uma solução razoável poderia ser a eleição de todos os membros da CNE por uma maioria de dois terços dos deputados da Assembleia Nacional. Tal implicava que os principais partidos teriam de estar de acordo em relação à composição concreta da CNE. Mas, no final, poderiam nunca chegar a qualquer concordância e não haver sequer eleição. Isto não é inédito, algo semelhante em Espanha se está a passar em relação aos órgãos de gestão do poder judicial.
É por isso que se pode falar de um beco sem saída em relação à CNE. A questão é que o problema não é institucional, mas estrutural. Dito de forma simples, não é um problema da entidade que regula as eleições, mas das próprias eleições.
De acordo com a actual Constituição (2010), apenas há uma eleição, que ocorre de cinco em cinco anos e que tudo decide: decide quem é o Presidente da República, quem é o governo, os deputados da Assembleia, os governadores das províncias, os administradores municipais, tudo. Tudo deriva deste momento único. A eleição é uma eleição de tudo ou nada. Quem ganha tem tudo, quem perde fica com nada. Não admira a pressão enorme com que as instituições se confrontam, os maniqueísmos e radicalismos que suscitam.
A realização de várias eleições para diferentes órgãos em vez de uma única eleição que define tudo traria inúmeros benefícios para a descompressão e desradicalização da situação política, garantindo representatividade, equilíbrio de poderes e uma governação mais eficaz. Em primeiro lugar, ao separar as eleições para distintos órgãos, como o Parlamento, a Presidência e órgãos descentralizados, assegurar-se-ia que cada entidade fosse escolhida com base nas suas funções específicas, evitando a concentração excessiva de poder num único grupo político — assim, o que perde numa eleição pode ganhar noutra. Deixa de se tratar cada eleição como uma questão de “vida ou morte”.
Além disso, eleições separadas permitem que os cidadãos expressem as suas preferências de forma mais refinada. Por exemplo, podem votar num partido para o parlamento e num candidato independente para a presidência, reflectindo as suas diferentes visões sobre gestão legislativa e executiva. Esse sistema fortalece o pluralismo político, promovendo maior diversidade ideológica e assegurando que diferentes segmentos da sociedade sejam representados.
Adicionalmente, eleições separadas permitem ajustes progressivos no cenário político. A população realiza mudanças gradativas, em vez de ter de esperar por uma única eleição que redefina toda a estrutura governamental.
A realização de várias eleições separadas reforçaria o consentimento popular e, sobretudo, garantiria a acalmia necessária à vida política angolana.
Maka Angola
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