Há ditados que nunca envelhecem. Um deles, bíblico, atravessou séculos, religiões, filosofias e até códigos jurídicos: “Pelos seus frutos os conhecereis.” Pois bem, olhemos os frutos do Tribunal Constitucional de Angola. O pomar não engana.
Hoje, atrevo-me a entrar num terreno que não é o meu campo de especialização, o do Direito. Mas, como cidadão atento, leitor persistente e observador inquieto, é impossível ignorar o que tem sido o comportamento do Tribunal Constitucional. O Tribunal Constitucional, tal como hoje se apresenta, parece ter abdicado do seu papel de árbitro neutro para se tornar num jogador disciplinado de uma equipa já escolhida e adivinhem qual: a do partido que está no poder.
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É interessante observar como a linguagem jurídica, que deveria ser clara e universal, é agora utilizada como arma de confusão. Onde a Constituição diz “sim”, o Tribunal encontra um “talvez”. Onde diz “não”, o Tribunal vê uma “interpretação extensiva”. A hermenêutica constitucional transformou-se num exercício de ginástica semântica, em que a lógica é retorcida até encaixar nos caprichos do poder. É o que Norberto Bobbio chamaria de “traição dos princípios”: quando a forma sobrevive, mas o espírito morre.
Montesquieu, o pai da teoria da separação dos poderes, escreveu que “não há liberdade se o poder de julgar não estiver separado do poder legislativo e do executivo.” Pois bem: em Angola, o poder de julgar não apenas se mistura, ele se submete. A independência judicial tornou-se um mito recitado em discursos e ignorado em sentenças. O Tribunal Constitucional, em vez de ser o freio e contrapeso do poder, tornou-se o seu prolongamento jurídico.
É certo que nós, cidadãos comuns, não somos juristas. Não dominamos o latim das sentenças nem o jargão das petições. Mas a língua portuguesa é suficientemente clara para compreendermos quando a injustiça se disfarça de sentença. E quando um Tribunal decide quase sempre a favor do mesmo lado, já não se trata de coincidência, mas de padrão. O Tribunal Constitucional tornou-se previsível e previsível, no campo da justiça, é o primeiro sinal da sua morte.
Laurinda Cardoso, presidente da instituição, e demais juízes, carregam nos ossos e na medula uma genealogia partidária tão evidente que nem a toga consegue ocultar. Não é preciso ser jurista para perceber, basta saber ler e interpretar português. A Constituição diz “A”, mas eles encontram “B”, “C” e, se preciso, inventam um alfabeto paralelo. A toga, nesse contexto, é apenas um disfarce elegante de um militante em repouso. A imparcialidade tornou-se ficção, a jurisprudência tornou-se argumento moldável, e o cidadão, esse, é apenas um espectador perplexo do teatro da legalidade. As decisões vêm vestidas de erudição jurídica, com citações e vírgulas estrategicamente colocadas, mas por trás dessa toga formal repousa o vício do favoritismo.
Hans Kelsen, o “pai” do direito constitucional moderno, acreditava que um tribunal constitucional deveria ser o garante supremo da legalidade. No nosso caso, Kelsen deve estar a dar voltas no túmulo. Porque aqui o Tribunal Constitucional não é o garante da Constituição, é o garante da conveniência.
Esta simulação de justiça tem custos profundos. Enfraquece a confiança nas instituições, mina o Estado de Direito e cria um sentimento de desesperança coletiva. O cidadão começa a perceber que o seu voto, a sua voz e até o seu direito têm valor apenas se coincidirem com os interesses de quem manda. E quando um povo perde a fé na justiça, perde também a fé na própria ideia de Estado. Onde o árbitro não apenas favorece uma equipa, como joga com a camisola escondida debaixo da toga. Aristóteles já avisava que “a injustiça, quando se torna comum, deixa de ser erro, passa a ser sistema”. Pois em Angola, o sistema judicial é o erro institucionalizado.
Um dia, inevitavelmente, a História pedirá contas. Porque a impunidade é um empréstimo, não uma herança. Chegará o dia, porque a história é madrasta, mas tem memória longa, em que muitos desses juízes terão de explicar-se. Hoje, escondem-se sob a imunidade constitucional, amanhã poderão ter de enfrentar o tribunal mais implacável de todos: o da História. E a História não arquiva processos. Um dia e esse dia virá, a História pedirá contas. Tal como os tribunais de Nuremberga julgaram os que se esconderam atrás da “legalidade do regime.
Enquanto isso, a cada decisão previsível e enviesada, a cada malabarismo jurídico para salvar a face do poder, o Tribunal Constitucional vai colhendo os frutos da sua própria árvore. E, como já dissemos, pelos seus frutos os conhecereis.
Horácio dos Reis/Jornalista
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