Morte no Rio Congo- Sousa Jamba

 


Um incêndio e o naufrágio no Rio Congo, esta semana, ceifaram a vida de pelo menos 148 pessoas, com outras 100 desaparecidas. O HB Kongolo, que transportava cerca de 500 passageiros, incendiou-se perto de Mbandaka quando alguém cozinhava a bordo. Muitos afogaram-se ao tentar escapar das chamas. Sobreviventes com queimaduras de terceiro grau ainda aguardam assistência médica dias depois.


Tais tragédias são frequentes na República Democrática do Congo. A ausência de regulação no transporte e as condições desesperadoras forçam as pessoas a embarcar em embarcações inseguras. Contudo, este não foi um mero acidente. Resultou de uma negligência sistémica que torna tais desastres previsíveis e evitáveis.


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No último ano, atravessei o Rio Congo de Kinshasa a Brazzaville. Embora tenha passado grande parte da minha vida perto da água, só aprendi a nadar há nove anos, usando um snorkel. A água ainda me causa apreensão; não por duvidar da minha capacidade, mas por conhecer a sua natureza enganadora. Parece calma e acolhedora, mas pode tornar-se perigosa sem aviso.

Durante essa travessia, insisti em coletes salva-vidas. Verifiquei-os pessoalmente, perguntando-me: e se a embarcação virasse? Algum de nós sobreviveria?


No início de 2022, em Luanda, embarquei num pequeno barco com amigos rumo à Ilha do Musulu. Tínhamos coletes salva-vidas, mas o jovem piloto não dispunha de equipamento de emergência. Não forneceu instruções de segurança. Quando questionei sobre perigos anteriores, ele admitiu que já havia naufragado duas vezes; em ambas, com o barco sobrecarregado.


Certa vez, na Zâmbia, a partir de um barco num lago profundo, vi pescadores que não sabiam nadar. O timoneiro explicou que não era por ignorância, mas por escolha; recusavam-se a aprender por respeito aos espíritos das águas. Acreditavam que nadar ofenderia as forças que regem suas vidas e mortes. Trabalhavam humildemente, à mercê das águas.


Essa mistura de reverência, necessidade e negligência define as viagens fluviais na Bacia do Congo. Mas há opções melhores.

O desastre reflete quatro falhas fundamentais:

Primeiro, a ausência de regulação e fiscalização. O barco estava sobrecarregado. Cozinhar numa embarcação de madeira lotada de passageiros persiste porque ninguém faz cumprir regras básicas de segurança. Coletes salva-vidas, extintores de incêndio e exercícios para naufrágios deveriam ser obrigatórios. A fiscalização deve existir não apenas no papel, mas na prática; em terra e na água.


Segundo, a infraestrutura é insuficiente. O Congo depende dos seus rios porque as estradas são intransitáveis ou inexistentes em muitas regiões. O transporte fluvial torna-se a única opção viável. Mas essa dependência não precisa ser mortal. Investimentos em estradas, ferries e transporte fluvial público seguro ofereceriam alternativas.


Terceiro, a resposta a emergências é praticamente inexistente. A maioria das vítimas desta tragédia afogou-se ou queimou porque não havia instruções de segurança, treino ou sistemas de emergência. Tal como na minha viagem a Musulu, ninguém pensa em alertar os passageiros ou transportar kits de segurança. O Congo precisa de uma cultura de preparação para emergências; com operadores de barcos treinados, serviços de resgate equipados e passageiros que saibam o que fazer quando o desastre ocorre.


Quarto, a pobreza alimenta a sobrecarga. As pessoas lotam os barcos por necessidade, não por ganância. Quando há apenas uma embarcação disponível, todos se amontoam; porque ficar para trás não é uma opção. Se o governo e parceiros internacionais subsidiassem mais opções de transporte, implementassem bilhetes regulados e oferecessem alternativas mais seguras e acessíveis, as pessoas não arriscariam a vida tão facilmente.


Após o incidente, muitos feridos permanecem sem tratamento. A ausência de cuidados pós-desastre agrava o trauma. Uma estrutura permanente e bem equipada de resposta a emergências; coordenada com clínicas locais e organizações como a Cruz Vermelha; garantiria que os sobreviventes recebessem cuidados adequados.


Esta tragédia não decorre de má sorte, mas de negligência; por parte das autoridades locais e nacionais, dos planeadores de infraestruturas e das instituições internacionais que ignoram a crise de transporte no Congo. Conheço a vulnerabilidade de estar num pequeno barco num rio vasto e imprevisível. Perguntei-me: “E se algo acontecer?” Para aquelas 148 pessoas, esta semana, algo aconteceu.


Os rios do Congo proporcionam sustento, transporte e conexão num país vasto com poucas estradas. Mas não precisam de ceifar tantas vidas. Um transporte fluvial seguro exige vontade política, investimento e aplicação consistente de regulamentos.

Os mortos merecem mais do que manchetes fugazes e compaixão passageira. As suas mortes devem impulsionar ação; para regular embarcações, formar tripulações, melhorar infraestruturas e estabelecer sistemas de resposta a emergências.


Sem essas mudanças, o próximo desastre está à espreita; tão certo como o fluir do rio. A escolha é clara: agir agora ou contar mais corpos depois. O Rio Congo continuará a transportar o seu povo. A questão é se essas jornadas terminarão em vida ou em morte.


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